INTOLERÂNCIA AO CONTRADITÓRIO
Agostinho Dalla Valle

Respeitar os pontos de vista diferentes – como é difícil. Aprendi a duras penas que todos têm direito ao contraditório, respeitando os que pensam diferente, mesmo que não concordemos. Só o tempo amadurece em nós essa competência.

Não aceitar o contraditório fere o princípio da vida em sociedade. É negar o direito do outro de se manifestar. A intolerância ao contraditório torna a vida irrespirável. É difícil, mas é necessário.

“Se existe um único segredo para o sucesso, ele está na capacidade de ver as coisas sob o ponto de vista da outra pessoa.” – Henry Ford

Simpatizar com algo ou ter alguma opinião, ainda que diferente, é um direito, mesmo que isto contrarie indivíduos ou grupos. Este é um dos pilares da vida em comunidade.

Devemos aprender a evitar o querer estar certo ou errado diante de algum tema. Ambas as afirmações são subjetivas, sujeitas a interpretações e normalmente carregadas de emoções. Especialmente em gestão, não existe apenas o certo e o errado, existem referências. E essas referências, quando colocadas em prática, levam a infindáveis discussões, mas sem debate, não há desafio e o resultado é pernicioso pois nos leva a estagnação de ideias. O raciocínio precisa ser oxigenado constantemente para buscar soluções diferentes – pensar diferente – fora da caixinha.

A verdade é que precisamos nos esforçar para entender a lógica que está por trás do pensamento de nossos contendores e buscar alguma conexão entre o que pensamos e o que eles pensam.

“Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar.” – Nelson Rodrigues

Gosto de discutir esse tema com um amigo – engenheiro, cartesiano puro – que se diz agnóstico, mas não ateu. É um belo debate que rende boas doses de whisky – ele acredita que faz bem à saúde – poucos carboidratos e não contém óleos, são os seus argumentos – que também geram contradições. É uma discussão quase igual com aqueles que se dizem ateus “graças a Deus”.

Conheço também muitos outros profissionais gnósticos – contrário dos agnósticos – que acreditam em verdades reveladas, em dogmas de gestão e normalmente não toleram quem pensa diferente. Os gestores gnósticos defendem e praticam decisões do tipo: estoques devem ser zerados; não devemos tomar financiamentos bancários em hipótese alguma; construir imóveis é melhor do que pagar aluguel; a previsibilidade é um “chute”; os bons colaboradores não precisam de bônus para cumprir suas metas, e tantas outra que inibem o contraditório e, consequentemente, a criatividade. Existem também os experimentalistas, esses são mais abertos ao contraditório, e sua principal filosofia de trabalho é o PDCA: Plan – Do – Check – Action. Esses, sabiamente, não geram conclusões e crenças antes de experimentar, antes de testar em pequena escala.

Toda vez que me pego a pensar em contraditoriedade, vem-me à mente a obra de Santo Tomas de Aquino que defendeu com afinco o equilíbrio entre a fé e a razão, e traz-me luz a esse eterno debate entre fé – razão – ciência. Atualmente, em época de pandemia do Covid 19, vivenciamos com mais contundência ainda essa discussão entre a razão e a ciência. A consequência é uma sociedade dividida entre os que acreditam apenas na solução do isolamento social – enquanto não tivermos vacinas suficientes e medicamentos apropriados – e os que entendem que os efeitos econômicos do distanciamento social são mais perniciosos. Na minha visão, sob melhor juízo, a causa está no obscurantismo de alguns, mas também em parte da mídia, totalitária, catastrofista e  ideologizada, que não admite o contraditório e que tem o poder de influenciar diuturnamente a consciência coletiva do medo.

O maniqueísmo, como doutrina religiosa do século III, divide o mundo dualistamente entre o bem e o mal, o certo e o errado. Esse conceito bastante popular à época sobrevive até hoje, em lado oposto a um mundo atual mais relativista e com diversidade de ideias.

No Brasil de hoje, as pessoas defendem politicamente suas ideias de forma maniqueísta, quase sectária, como se o seu partido fosse do bem e o partido adversário fosse do mal. Esse maniqueísmo político desencadeia uma forte desunião que coloca em risco até a democracia no país e afeta os negócios.

Ao final do meu mestrado em Gestão Empresarial, me perguntaram o que efetivamente sobrou de aprendizado. Eu afirmei que a minha principal lição foi admitir que em gestão empresarial não existe apenas o certo e o errado, o que existem são referências.

Recentemente, ouvi que foram cinco judeus que mudaram as perspectivas do mundo.

“Para Moisés, a Lei é tudo; para Jesus, o amor é tudo; para Freud, o sexo é tudo; para Max, o capital é tudo e, finalmente, para Einstein – tudo é muito relativo.”

Finalizo este tema concordando com os que sabiamente se questionam: afinal, eu quero ter razão ou quero ser feliz?

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